COLUNAS
Quimera
POSTADO EM 13 JAN 2013 por: André Luiz Alvez
No começo de 1988, recebi a ilustre visita do velho Rubem. Eu era um humilde discípulo e continuo tentando ser. Mas a amizade entre o tolo menino e o poeta cronista, era algo que não se podia mudar. Apresentei a ele o tereré ? que detestou, jogando longe o líquido amargo, numa cusparada de cara amarrada ? perguntando em seguida que droga era aquela; as mãos entreabertas e o dorso do braço cobrindo a boca ainda pingando tereré. Mas gostou da guavira, duvidando que aquela fruta fosse exclusividade da minha terra: ?Que nada. Já comi algumas nas matas de Cachoeiro?, e eu não quis confrontá-lo, mergulhado na ansiedade que a sua figura impoluta produzia em mim. Num dado momento, para meu assombro, esticou as pernas e subiu num pé de mangueira no quintal, apontando para uma fruta que só ele via; eu enxergava apenas galhos e folhas: ?Olhe para aquela lá do canto. Está madurinha. Venha me ajude apanhá-la!?. Eu quis subir naquela árvore, mas não consegui, barreiras surgiram do nada e fiquei estático, em pé, surdo e mudo no exato instante em que ele saltou ao chão, que ergueu uma poeira cinza, triunfante com uma manga madura nas mãos a me oferecer. Outros muros surgiram e eu não pude pegá-la. Queria apenas que ele compreendesse que eu era um menino ? ah, eu era um menino em 1988! ? e já havia lido quase tudo que ele escreveu. Tive vontade de pedir-lhe conselhos, que nunca deu a ninguém, mas, quem sabe, o ar puro de Campo Grande fizesse ceder a montanha de conhecimentos. Acho que ele percebeu, pois do nada citou Tolstoi: ?fale sobre sua aldeia, que você falará com o mundo inteiro?, e se calou no silêncio que durou preciosos minutos. Então, num daqueles vislumbres divinos, percebi o tanto que minha terra tinha a contar; e voei em pensamentos pelos bairros da minha infância; Taveirópolis, o Portão de Ferro, Caiçara, Guanandi, Taquarussu; fui além, visitei mentalmente Aquidauana, Piraputanga e o Pantanal. Percebi que o velho Rubem sorria um riso de canto de boca que não fez questão de esconder. E ao fixar meus olhos nos dele, enxerguei duas cabeças gigantescas de animais diferentes; o leão e a coruja , a força e a sabedoria. Assustado, apanhei o bilhete que ele escreveu enquanto eu divagava: ?leia depois, quando acordar!? e partiu sem se despedir. Tudo não passou de um sonho. Talvez, se eu tivesse um pingo das letras do velho Rubem, procuraria perdida em alguma gaveta a frase que ele escreveu. Daí então compreenderia que jamais eu poderia deixar escapar de mim o menino lírico que pretendia ser para sempre. O tempo não volta e o presente me cobra. E acordei com o vento nos calcanhares, a imagem do velho Rubem refletida na mente, o corpo voando nessa irresistível vontade de escrever.
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